Implante para esterilizar mulheres faz milhares de vítimas no Brasil
Diversas mulheres nos Estados Unidos e na Europa tem apontado o microimplante Essure, fabricado pela Bayer, como causa de graves efeitos colaterais com risco à saúde após a sua implantação. No Brasil, por ter sido indicado em programas governamentais de esterilização voluntária de pacientes de baixa renda em hospitais do Sistema Único de Saúde, os efeitos causados pelo Essure tomaram a proporção de problema de saúde pública.
O Essure é composto um par de stents em forma de mola, medindo 4 (quatro) centímetros, cujo diâmetro pode se expandir de 1,5 a 2 milímetros para se fixar nas paredes das tubas uterinas. Esses stents possuem uma estrutura interna de aço inoxidável, circundada por fibras de tereftalato de polietileno (PET), e uma estrutura externa de Nitinol (liga metálica de níquel-titânio). As fibras PET estimulam o crescimento dos tecidos das trompas para que se infiltrem nas molas, o que resulta na obstrução da passagem e, segundo promete a fabricante, na esterilização permanente das mulheres que recebem os microimplantes.
Por ser possível a sua implantação em ambulatório, de maneira rápida, por via vaginal, sem a necessidade de internação e, portanto, com baixo impacto na rotina das pacientes, a colocação do Essure é considerada uma técnica minimamente invasiva se comparada ao procedimento de laqueadura das trompas, por exemplo, que demanda internação, cirurgia e aplicação de anestesia. Por apresentar essas características, o microimplante veio como uma promessa de inovação aos meios de contracepção permanente.
Não obstante a facilidade para a sua implantação, por ter sido projetado como método definitivo, o Essure não pode ser removido sem causar consequências graves ao sistema reprodutivo feminino. Isso porque a mulher, caso decida pela remoção dos microimplantes, precisa se submeter a cirurgias de retirada das trompas. Em casos extremos e mais sérios, o útero também precisa ser removido.
No Brasil, a partir de fevereiro de 2009 o registro do Essure foi concedido pela ANVISA. Desde o início, sua importação e comercialização estiveram sob responsabilidade da Comercial Commed Produtos Hospitalares, com sede em São Paulo.
Por ser considerado um método simples, a partir de 2012 hospitais públicos passaram a indicar a sua utilização em pacientes que procuravam o SUS em busca de um método contraceptivo permanente. Foram vendidos cerca de 8 mil dispositivos a hospitais públicos no Rio de Janeiro, São Paulo, Pará, Tocantins e Distrito Federal, a um custo de cerca de 40 milhões de reais para os cofres públicos.
Em São Paulo, Rio de Janeiro, Pará, Tocantins e no Distrito Federal, as Secretarias de Saúde desenvolveram projetos pelo sistema público de saúde em que o Essure era oferecido como alternativa à laqueadura.
Ocorre que, após a colocação dos implantes, várias pacientes apresentaram complicações em sua saúde. E isso as obrigou a retornar ao hospital para que fosse feita a retirada do Essure. Entre os principais efeitos colaterais, o microimplante causou às pacientes mudança no ciclo menstrual, que ficou irregular e mais intenso, além de queda de cabelo, inchaço na barriga e dores abdominais e nas costas – sintomas esses que se mantém constantes e passaram a atrapalhar a vida das mulheres. Algumas chegaram a desenvolver inflamações pélvicas após a colocação das molas.
Nos Estados Unidos, onde o Essure foi mais utilizado, são no mínimo 26,7 mil notificações de eventos adversos atribuídos ao uso do microimplante, segundo a FDA (agência responsável por fiscalizar alimentos e medicamentos nos Estados Unidos). O ICIJ, Consórcio Internacional de Jornalismo Investigativo, apurou que, entre os registros, há cerca de 8.500 problemas detectados ao longo dos últimos dez anos em que o Essure precisou ser removido do corpo das pacientes.
Há vários anos as vítimas norte-americanas buscam na Justiça a reparação pelos danos que o Essure lhes causou. A própria Bayer admitiu, no início de 2018, ser alvo de ações judiciais movidas por mais de 16 mil pacientes nos Estados Unidos.
No Brasil, a procura pelas indenizações ainda está no começo. As principais queixas das pacientes se referem a episódios de gravidez indesejada, perfuração e migração dos implantes, além da necessidade de retirada do Essure por ocorrência dos efeitos colaterais graves – o que culmina com a mutilação do corpo da mulher pela retirada de suas trompas e, muitas vezes, útero.
Depois de milhares de críticas e processos judiciais no mundo todo, em 2017, a fabricante Bayer encerrou as vendas do Essure em vários países. O primeiro deles foi a Holanda, em 29 de maio, seguida pela Finlândia e pelo Canadá. Em todos os casos, a empresa citou argumentos vagos como a “mudança na demanda” pelo produto ou “razões comerciais” para justificar publicamente sua decisão.
Em agosto de 2017, a agência reguladora da Irlanda, rejeitou a renovação da aprovação do dispositivo, o que o impossibilitou de circular pela União Europeia. No mês seguinte, em setembro, a empresa fabricante anunciou o fim da comercialização do Essure em todos os países do mundo, exceto nos Estados Unidos.
Após a tensão mundial em torno da utilização do Essure, a FDA fechou ainda mais o cerco ao produto. A retirada do Essure do mercado norte-americano ocorreu em julho de 2018, quando a fabricante comunicou publicamente que, após 31 de dezembro, ele não mais seria vendido no país. Em nota ao ICIJ, além de reforçar que a decisão se deu por motivos comerciais, a Bayer declarou que houve um declínio no uso de anticoncepcionais permanentes e que existe “publicidade enganosa e incorreta a respeito do dispositivo”.
Apesar de ter sido utilizado em políticas públicas para promover métodos permanentes de contracepção no Brasil, está claro que o implante Essure pode causar severos danos à saúde das mulheres que aceitaram o procedimento. Esses danos são passíveis de indenização tanto pelo Estado quanto pela Bayer, fabricante do produto.
Por essa razão, as mulheres que sofrem com os sintomas ocasionados pelo implante, e também aquelas que já tiveram de passar por nova cirurgia para remover trompas e útero podem buscar essa indenização, pois se trata de dano irreversível à saúde.
Isso porque, nesses casos, a produção dos hormônios certamente será afetada – o que também trará necessidade de acompanhamento médico futuro, em procedimentos como reposição hormonal, entre outros.
Com o auxílio de um advogado de sua confiança, essas questões podem ser aprofundadas.